quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Mestre Sabal e o seu reisado familiar

Por Dandara Prado

Com 69 anos, Sabal tem o sonho de que 
reisado da sua família não acabe.
(Foto: Dandara Prado)
Homem simples e de coração enorme, Antônio dos Santos, ou Sabal como é mais conhecido, é o Mestre do Reisado do Marimbondo há 53 anos. Sua marca inconfundível é a risada alta que passa alegria a quem assiste ao espetáculo. O amor por “pisar” é o que o faz feliz. Como todo bom mestre e pai, ele ensinou esse amor para seus filhos e netos. Embora eles defendam que o amor pelo Reisado nasce com a pessoa.
Todo esse tempo de experiência e os transtornos da vida o transformaram em uma pessoa desconfiada, como ele mesmo diz, “cismado”. Geralmente, ao conhecer alguém novo, ele cria uma barreira de proteção. Mas, é só mostrar suas intenções e Sabal abre a porta da casa, da família e do seu coração. Para conquistá-lo, basta ser verdadeiro e ter os ouvidos atentos para ouvir suas histórias.
Se entristece ao ver o Reisado da sua família acabando por falta de recurso e convite para dançar. Guerreiro, sempre tirou dinheiro do seu sustento para fazer as roupas, transportar o seu grupo para os eventos e comprar instrumentos. No fundo, ele só quer a valorização e a continuação de uma dança que vem sendo passada de geração em geração.
Seu Antônio
Aposentado como Pescador, Sabal continua na ativa vendendo frutas e verduras na feira de Carmópolis nos domingos pela manhã. Sua roça, seu reisado e sua horta no quintal de casa é o que o faz feliz. Casou-se com 22 anos. Ele conta que a família dela não queria aceitar porque achava que ele era doido por dançar reisado. Aos 69 anos, é pai de oito filhos e possui vários netos. Uma família tão grande, que muitas vezes até ele perde as contas. Quando, durante a entrevista, perguntamos quantos filhos tinha, ele respondeu “Acho que uns 8, 9 ou 10”.

Dentre as atividades que pratica, cultiva a horta 
no quintal de casa é a preferida de Antônio.
(Foto: Dandara Prado)
Dos  oito filhos de dona Ismênia, Antônio é o mais velho. Assumiu o comando da família cedo, quando seu pai morreu e ele precisou ajudar a sua mãe no sustento da casa. Começou cortando cana, mas se orgulha de saber fazer várias coisas, inclusive construir canoa. Não teve tempo de ser alfabetizado, porém isso não faz dele menos sábio. Aprendeu a escrever seu nome para assinar documentos relacionados ao Reisado. Segundo Sabal, algumas pessoas já se aproveitaram do fato de ele não saber ler para o enganar. Inocente algumas vezes, já o fizeram assinar papeis em branco.
Para o seu neto Erick, Sabal é o orgulho da família. “Meu avô representa muito para mim. Desde criança que eu vejo ele brincando reisado. Eu até já brinquei com ele um tempo, mas não está no sangue mesmo brincar. Quem sabe daqui pra lá eu não volto a brincar. Ele é um grande pai, filho, mestre do Reisado, avô.”
Mestre Sabal
Apesar de nascer no meio do Reisado, Sabal começou a “pisar” mesmo com 10 anos, quando representava a figura do boi. Tornou-se Mestre e assumiu o lugar de Palhaço Mateus aos 16 anos, depois que este, que na época era contratado, arranjou confusão e foi expulso do Reisado. O maior medo da sua mãe, dona Ismênia, era que o público achasse que ele era jovem demais e deixasse de convidar o Reisado do Marimbondo para as festas. Ao contrário do que ela temia, seu filho se tornou conhecido em Sergipe por sua alegria infinita e risada única.
Segundo ele, o apelido Sabal surgiu ainda pequeno, quando ele brincava de “quatro-pés” com os amigos, ou seja, um abaixava e o outro pulava por cima. Como tinha facilidade na brincadeira, as crianças começaram a falar que parecia sabão: escorregava fácil. De sabão virou Sabal. No começo, Antônio se irritava com o apelido. “Mas, como criança quando se irrita com o apelido, aí é que o apelido pega mesmo. Todo mundo começou a me chamar assim”, explica ele.
As vestimentas do Palhaço Mateus são coloridas e o grande
destaque é o chapéu pontudo e enfeitado.
(Foto: Dandara Prado)
A pintura do rosto, com uma cruz na testa, e a roupa florida são os elementos que o transformam em Palhaço Mateus. É fácil identificá-lo no grupo pelo roupa diferente, pelo chapéu pontudo e por sempre ficar no centro junto com a Dona Deusa. O seu inseparável apito é o que marca os passos e transfere um tom de autoridade. Dentro do Reisado, o Mestre Sabal também teve outras funções. Apesar de ter sido autodidata nos instrumentos, ele ensinou aos seus filhos a tocar. Hoje, além de participarem tocando na parte instrumental do Reisado, eles também têm uma banda de pé de serra.
Mesmo com a idade avançada, Sabal não diminui o ritmo e continua com a mesma energia de quando começou a “pisar”. Essa é uma das suas maiores característica. Ele se orgulha de ser assim, nas palavras do próprio: “Só quando eu morrer, ou ficar doente né? Ai todos os meus filhos estão preparados para assumir, o que tiver desocupado vai".

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